tatiana pequenoa

TATIANA PEQUENO

METAFÍSICA DA REPETIÇÃO

como se faz para que o dia seja livre
perguntava
distante e muito próxima do cano ligante
transparente pelas artérias
como se faz para que o dia seja leve
demandava
silente e rubra de fato muito nua
na voz que ressoava de dentro
como se faz para que o dia não doa
esperançava
vagando cedo sem mais vermelho no cabelo
sem mais vermelho subindo pelo vento
no sentido inverso das ruas
como se faz
para não afundar
com a lama
nunca duvidava
e du(vida)r da sina
pareceu sempre
a coisa mais dura
nesta parte do mundo
onde nada impede
o crescimento


REPETITION METAPHYSICS

how do you make the day free
i asked
distant and closer to the ligand channel
transparent through the arteries
how do you make the day light
i demanded
silent and ruby in fact very naked
in the voice that resonated from within
how do you make the day not hurt
i wished
wandering early with no more red in the hair
no more red blowing in the wind
in the inverted sense of the streets
how is it done
not to sink
in the mud
never doubting
and doubt-casting fate
always seemed
the hardest thing
in this part of the world
where nothing impedes
the growth
hallucinated
by the eyebrows.


2016, AQUELE ANO

vocês viram os sabres se levantando vocês
viram os sabres sendo empunhados vocês ´
preferiram vir descendo lentamente as armas
vocês esperavam que a cabeça fosse entregue
em alguma bandeja dourada onde os olhos sós
estivessem espelhados vocês se juntaram para
furar o inimigo vocês delinearam uma zona apa
rentemente pacífica de proteção a quem não le
vava as suas e outras cabeças e os olhos sós
quiseram o inimigo retalhado furaram por anos
os órgãos do inimigo prepararam por anos lenta
mente os sacrifícios lustrando diariamente os ca
nos das espingardas ultrapassadas descobertas
da escavação mais importante que nunca foi feita
vocês vieram com outras armas esperando a má
cula incontornável da destruição mas encontraram
uma fúria com voz de mulher que já havia cansado
das fogueiras mas vocês insistiram nas fogueiras e
passaram a atear fogo vagarosamente porque é o
que fazemos, vocês dizem, o que fazemos há
séculos é descrever a prática de nossas torturas
e a poesia há de sucumbir aos rigores de nossa lei
a poesia há de sucumbir aos dissabores desta vez
arrancamos sua cabeça e oferecemos sua cauda
uma velha feiticeira com ratos entre as pernas
nós que assassinamos seus nomes pela ordem
nós assinamos as regras deste novo livro desta
antiga e nova era este compêndio atualizado de
nova vergonha: malleus maleficarum maleficat


2016, THAT YEAR

you saw the sabers raising you
saw the sabers being wielded you
preferred to come slowly lowering
the weapons you expected the head was
delivered on some golden tray where the lonely
eyes were mirrored you got together to
foil the enemy you outlined a peaceful protective
zone apparently for people who did not take
their and others’ heads and the lonely eyes
they wanted of the enemy shredded stuck
the enemy’s organs were prepared for years
slowly the sacrifices shining daily the barrels
of the outdated shotguns discovered
among the most important excavations ever made
you came with other weapons waiting for the
unavoidable stain of destruction but found
fury with the voice of a woman who had already
tired of the campfires but you insisted the fires
were started leisurely because it is what
we do, you say, what we have done for
centuries is to describe the practices of our torturers
and poetry will succumb to the rigors of our law
the poetry will succumb to the sorrows of this time
we take off your head and we offer your tail
an old witch with rats between her legs
we who murdered their names in order
we signed the rules of this new book this
old and new era this compendium updated
from new shame: malleus maleficarum maleficat


1999 – 2019

palco imenso, luz baixa

homens lendo
poesia

o frame, a performance

um papel
uma lista

xenical
lítio
imosec
imipramina
hipofagin
enalapril
desobesi
centella asiática
fluoxetina
sibutramina
tegretol
garcinia cambogia
clonazepan
mazindol
losartana
bupropiona
valium
sertralina
pholia magra
metformina
atenolol
topiramato

—nasceu,
é menina.


1999 – 2019

immense stage, low light

men reading
poetry

the frame, the performance
a paper
a list

imosec
imapramine
hipofagin
enalapril
desobesi
centella asiatica
fluoxetine
sibutramine
tegretol
garcinia cambogia
clonazepam
mazindol
losartan
bupropion
valium
sertraline
pholia magra
metformin
atenolol
topiramate

—born,
a girl.

—translated by sean negus
Tatiana Pequeno is a poet and author of the collections réplica das urtigas (2009), Aceno (2014), and Onde estão as bombas (2019) among other critical titles. Pequeno holds a Ph.D. in Vernacular Letters of Portuguese and African Literatures and she is Professor of Portuguese Literature at Universidade Federal Fluminense.