valeska torres

VALESKA TORRES

NÓS DOIS CANTANDO SIDNEY MAGAL NA FEIRA DE SÃO CRISTÓVÃO
Para o Fernando

estação da Penha
desemboco perdida na linha de fuga, percebo
– como se percebem os furos de tatuí na areia de grumari –
o grão de purpurina no fim do carnaval
são quatro por dois isso que inflama o meu peito
não chupo a espinha do peixe,
não como mocotó

sonho em me bronzear sob o sol de ramos
me banhar no piscinão
ao seu lado
com as mãos entrelaçadas nas suas
bebendo itaipava

sou mulher de gostos caros, digo a você enquanto
rasga meu sutiã
gasto
por amaciantes

picho na murada do prédio
seu nome <3 meu
para que você saiba o quão merda eu sou
quando apaixonada

meus pais me apontam dedos disseram para não me perder demais
¡perigo águas profundas, correnteza e redemoinho!
é tarde, depois de meia noite
nossos horários são verões
é tarde

estou fudida
porque a foda tem o gosto do meu homem
e disso os meus lábios não cansam

 

THE TWO OF US SINGING SIDNEY MAGAL AT FEIRA DE SÃO CRISTÓVÃO
to Fernando

Penha station
I disembark lost in the vanishing point, look
– as one looks at the holes made by sand crabs in grumari –
the tiny glitter at the end of carnival
it’s four for two what flames my chest I
don’t suck on fish bone
don’t eat mocotó

I dream of sun tanning under the ramos sun
bathe in the piscinão
next to you
with our hands intertwined
drinking itaipava

I am a women of expensive tastes, I tell you while you
rip my bra
worn out
by fabric softeners

I spray paint on my building’s wall
your name <3 mine
so that you know how shitty I am
when in love

my parents point fingers at me told me not to go too far
¡danger deep water, current and whirlpool!
it’s late, after midnight
our times save daylight
it’s late

I’m fucked
because the fuck tastes like my man
and my lips can’t get tired of it

 

CORAÇÕES DE ALCAHOFRA

corações de alcachofra em conserva de óleo
mastigados depois do jantar sobre a mesa
os pratos, os talheres, os corpos usados

abutres miúdos e vesgos
rasantes
afiam suas unhas no amolador de facas

arrancam as peles gorduras
jogam na vala atrás de minha casa
desfiguram a carne putrefata

explosões sucateiam o ferro
que agora corroído serve de mordaça
a cidade dorme como se nunca houvesse
amanhecido

na madrugada
forra-se um tapete infestado
de ácaros

cheiro de alho na sola dos pés
caminhando sobre as ruas
velhos não usam sapatos

deus não anda entre os meus
sobrevoa em helicópteros
arranha-céus
onde dorme em colchão de penas

 

ARTICHOKE HEARTS

artichoke hearts preserved in oil
chewed after dinner on the table
the plates, the cutlery, the bones used

cross-eyed tiny vultures
sweep through
sharpen their nails on the knife grinder

rip the skins greases
thrown in the ditch behind my house
disfigure the putrefied flesh

explosions scrap the steel
which now corroded serves as a gag
the city sleeps as if it had never
dawned

early morning
covers a rug infested
with mites

smell of garlic on the soles of the feet
walking over the streets
old people don’t wear shoes

god doesn’t walk among my kind
flies over in helicopters
skyscrapers
where he sleeps on a feather mattress  

 

DA TESTA LARGA

restaram o gosto do suor salgado em que o beijava pelas ruas de bonsucesso
restaram as coxinhas massudas e oleosas que secavam no escorredor sujo com pedaços de
frituras queimadas
restaram a paçoquita moída na embalagem fechada
sobraram os chupões estampados no pescoço
e o varar das noites
você, enfiando com doçura amor
com doçura
sua piroca sem que seus pais pudessem ouvir

amar pode ser longo demais para alguém como eu,
você disse
que deixo botijões de gás abertos
pincelo blush nas maçãs das minhas bochechas pinto meus lábios com batons fortes
chupo paus e engulo a
porra

um perigo eminente seria demais amar por tanto tempo o perigo

uma hora – nunca se sabe qual hora – pode ser às 13h ou às 2h45 da madrugada–
mas nessa hora é preciso cerrar bem forte os punhos
esmurrar o estômago do desgraçado
até que então, purifiquem
os beijos

 

WITH WIDE FOREHEAD

remained the taste of salty sweat in which I kissed him through the streets of bonsucesso
remained the doughy oily deep fried coxinhas draining in the dirty colander with pieces of
burnt fried batter
remained the crushed paçoquita in the unopened package
left the hickeys stamped on the neck
and the all-nighters
you, sticking it sweetly love
sweetly
your cock without waking your parents

loving can be too long for someone like me,
you said
I who leave gas cylinders open
wear blush on my cheeks paint my lips with strong lipsticks
suck dicks and swallow the
cum

an eminent danger would be too much love the danger for so long

sometime – you never know what time – it can be at 1pm or at 2h45 in the morning
but at that time you must clench your fists very tight
punch the motherfucker’s stomach
until they’re purified
the kisses

 

CARNE MOÍDA

Torrando no meio fio do Ceasa,
homens armários me olham de esguelha,
sabem que ferida aberta é lugar pra mosca botar ovos.

Abobrinha carne moída arroz feijão
o prato à mesa.

Rolam os dados
no tribunal
vencem
mais fortes
de pele
de olhos
de cabelos
de sacos
no cemitério de Inhaúma
um após o outro.
Pretos acumulando cargas
dentro de caminhões baús
o burrinho sem rabo empenando
um sol à pino
gargalha
ele ri de mim
ele ri de todos
menos
das sungas maiôs

Búzios. General Osório. Zona Sul.
Praias e mais praias com gente miúda na quarta-feira
o dólar em alta magra sexy salto 15 saindo da boate um escândalo
na bolsa da mulher um garoto baleado correndo entres os carros da avenida Nossa Senhora de Copacabana, onde foi que a Senhora se escondeu?

Anteontem pintei as unhas
de vermelho
pelas ruas de São Paulo
o gongo soou um colapso nervoso, gritou comigo
                    não revido

Acumulam-se inacabados:
         cinco ou seis projetos arquitetados a essa hora do dia
      remendados com fita crepe.
      dois ou três possíveis relacionamentos que nunca me
   disseram hora ou lugar de encontro.
      um quebra cabeças, duas costuras no rasgo de minhas blusas,
   46 horas mal dormidas.

Depois de velha e pelancuda o que me resta é ser comida pelas traças
em mim cabem
vigas aço concreto camisinhas cacos estiletes balanças dedos esmalte absorvente fígado
queijo nojo nojo nojo nojo nojo

 

GROUND MEAT

roasting in the curbstone of Ceasa,
men wardrobes look at me slanting,
know that open wound is for flies to lay their eggs in.

squash ground meat rice beans
the dish on the table.

The dices roll
in court
win
the strongest
of skin
of eyes
of hairs
of sacks
in the Inhaúma cemetery
one after the other.
Blacks accumulating cargo
inside forward control trucks
the tailless donkey jamming
a high sun
laughing heavily
he laughs at me
he laughs at everyone
except
the briefs swimsuits

Búzios. General Osório. Zona Sul.
Beaches and more beaches with tiny people on Wednesday
the dollar on the rise tall skinny sexy size 15 heels walking out of the club it’s a scandal
in the woman’s purse a kid gets shot running between cars on the avenue
Our Lady of Copacabana, where did the Lady hide?

The day before yesterday I painted my nails
red
through the streets of São Paulo
the gong sounded a nervous breakdown, yelled at me
                    I don’t reply

Accumulate unfinished:
         five or six projects engineered at this time of the day
      mended with crepe tape.
      two or three possible relationships that never
   said the time or place to meet.
      a jigsaw puzzle, two stitches on my blouses’ tear,
   46 poorly slept hours.

After I’m old and fat what’s left for me is to be eaten up by moths
I can fit
beams steel concrete condoms cracks stilettos scales nails polish tampons liver
cheese nausea nausea nausea nausea nausea

—translated by lucas van hombeeck
Valeska Torres is a poet. She was born in Marechal Hermes, Rio de Janeiro, in 1996. She has published poems in the collections Do rio ao mar [TURISTA APRENDIZ, 2015], Seis temas à procura de um poema [FLUP, 2017], in fanzines edited by KZA1 publishing house and various online platforms. She was a finalist of the Slam das Minas RJ 2017. She is the only Brazilian to be selected for an artistic residence in the 25th International Poetry Festival of Rosário, Argentina.
Lucas van Hombeeck is a translator, poet and editor based in Rio de Janeiro. Some of his translations of contemporary Brazilian poets such as Carla Diacov, Heyk Pimenta, Frederico Klumb and Ana Carolina Assis have been published in DUSIE 21. As a member of the Experimental Poetry Workshop (Oficina Experimental de Poesia) published the book Almanaque Rebolado (2016, Azougue/Garupa/Cozinha Experimental). In 2018, edited the pamphlets “Megamao” (Rafael Zacca) and “Entropias de eixo e beira” (João Gabriel Pontes) with the Caju publishing collective.