carla diacov

CARLA DIACOV

para ISAURA

a vênus de willendorf tem
a capacidade aberta e usada desde sempre
especialistas dizem
a vênus de willendorf
era usada em ritos de fertilidade
pequena usável
era usada como amuleto era
usada como objeto de limpeza abjeto
introduzido na
capacidade das vênus ordinárias era
usada como peso de segurar porta aberta
era usada para mexer alimentos ritualísticos
era usada na fervura dos alimentos mais ordinários
usada na terra era plantada antes dos alimentos
usada bolota aromatizadora pingava-se
óleo de casca de árvore ordinária na capacidade
da vênus de willendorf
que ficava ali ao uso do recinto
a vênus de willendorf era usada
dizem os especialistas
usada como socador de ervas
usada como amplificadora da pequenez
das outras vênus
todas ordinárias
usada para amaciar

carnes relações couros discussões
pois basta olhar para a vênus de willendorf
notável pequena usável
hojendia os especialistas usam
a vênus de willendorf
em suas especialidades
a vênus de willendorf jamais deixou de ser usada

duas mulheres cometem conversas
elas se sentam também onde se desentendem machos
cruzam as pernas e as palavras besuntadas do
típico muco com muito daquele hormônio que se vende
a preço de coisa para erguer casas de sacanagem
são deselegantes são galinhas sambistas
begônias indesejáveis falam sobre outras sentadas
mulheres doutros lugares mulheres que se sentam como
camelas focas velhas vermelhas mancham
a tudo do que dizem vazam mulheres que vazam
pensamentos com espinhos e larvas em estágios de
sujices coaguladas
falam com
pretensões de antenas transmitem sentadas
exalam e transmitem línguas lagartas são cobras
espalhafatosas se tocam e há saliva onde o toque
duas mulheres assentadas sem roupas sem hobbies
sem tempos em tempo
mulheres cavadas buracos de minhoca trocam senhas
filhotes e ervas de assar filhotes
duas dessas que não são daqui
e graças a alguma divindade muito safada a gente
nunca vai ver dessas que não são daqui
ainda que a esperança seja jamais as veremos
a não ser que uma grande cólica um grande presságio

em dilatação a não ser que
umas que se sentam
a não ser que sim duas
mulheres cometem sentadas conversas

mais muito mais que um risco
na parede imunda de azul
está o cervo descascado
a multidão que por ali passa
imunda de pressa e conversas muito concretas
não sabe o risco o cervo muito
embora uma criança vermelha
em cólicas
como o céu
tenha derramado três ou quatro segundos
sobre o chão que aponta o cervo o risco
e prontamente uma tarde laranjal será o recreio escolar
imundo de riscos imundo do cervo
transplantados para o furo no guarda-sol pipoqueiro
a cólica o nome da criança todo mundo sabe a
cólica o nome da criança é exceto
exceto a multidão a cólica
exceto ele é o nome
exceto
o filho do cervo

todas as tetas
da mulher que sou todas as
manias dos braços dos dedos
toda palheta no mapa que trago comigo
todas as minhas mães irmãs
todas as claras todas as gemas
todos os ovos que não vingaram todos
os momentos alguns outros momentos que não
nenhuma chave um risco de janela todas as
cortinas umas poucas ondas quase todas as
conchas desistidas todos os pelos axilas
uns rios umas abelhas todas as folhas léguas
tudo de extra tudo colhido pelo caminho
no desvio nos mais particulares desvios
algumas agressões toda a violência
réguas anáguas regras vermelhas
todos os ponteiros e qualquer vez
da mulher que sou braços tetas dedos
umas páginas todos os erros de corte todos
os livros errados qualquer canoa sobre árvores
umas unhas mal cortadas nenhuma
trava nenhuma carne qualquer suspeita
falo de todas as vezes em que um
homem se coça

é por aqui que falo todas as vezes
da mulher que me pretende catalogada mulher
daqui de onde falo

havia somente uma cadeira para o casal
na cadeira se sentava a esposa ovulada
e se sentava a esposa menstruada
o homem na cadeira se sentava ereto havia
somente esta convenção entre o casal
que a cadeira fosse o rito regulador
da sujidade espécie de objeto de contaminação
das coisas mulher nas coisas homem
depois se deitavam na tão somente cama para um
nunca aconteceu a gravidez e a esposa morreu sentada
na cadeira o marido se casou de novo mas
a nova esposa trouxe junto outra cadeira e
nunca aconteceu a gravidez pensou
o marido primeiro
não usamos a mesma cadeira
o marido morreu na primeira cadeira
e a segunda esposa ficou com a casa
com a somente cama e se desfez da primeira
cadeira
um pescador comprou a cadeira por três
sardinhas magras e se sentava na cadeira
diante do mundo e exatamente do mundo se soube
cercado da áurea primeira
uma cadeira onde a primeira
e a contaminação

o pescador estava a gerar outra cadeira
a terceira
uma
filha daquela convenção primeira


for ISAURA

the venus of willendorf has
an open capacity and has been used since forever
specialists tell us
the venus of willendorf
was used in fertility rites
a usable-small
was used as an amulet was
used as an abject cleaning object
introduced in the
capacity of ordinary venuses she was
used as a weight for stopping-open doors
was used to blend ritualistic foodstuffs
was used in the boiling of the most ordinary foods
used in the land she was planted before food
used as a flavoring acorn one dripped
ordinary tree bark oil in the capacity
of the venus of willendorf
who stayed there for the use of the settlement
the venus of willendorf was used
specialists tell us
used as a pestle for herbs
used as a magnifier of the littleness
of the other venuses
all ordinary
used to tenderize
meat relations leathers discussions
because just look at the venus of willendorf
noteworthy usable-small
nowdays the specialists use
the venus of willendorf
in their specialties
the venus of willendorf never stopped being used

two women commit conversations
they’re also seated where machos disagree
they cross their legs and cross their words smeared with
typical mucus with so much of that hormone sold
at the price of something to build a bordello
they’re inelegant they’re undesirable
samba-hen-begonias talking about other seated
women from other places women seated like
old red seals camels they smear
everything they talk they leak women who leak
spiked thoughts and larvae in stages of
coagulated filth
talk with
pretensions to antennae seated they transmit
exhale and transmit lizard languages they’re gaudy
snakes touching and there’s saliva where the touch
two women settled without clothes without hobbies
with no times in times
dug-out women wormholes they trade passwords
puppies and herbs for roasting puppies
two of them who aren’t from here
and thanks to some really nasty deity we’ll
never see those women not from here
although the hope is for us never to see them
unless a big cramp a big omen
in dilation unless
some who are seated
unless yeah two
women commit seated conversations

more much more than a scratch
on the wall filthy with blue
is the buck flayed
the crowd going by
filthy with flurry and such concrete conversation
doesn’t know the scratch the buck
even though a red child
in cramp
like heaven
spilled three or four seconds
on the ground pinpoints the buck the scratch
and promptly an orange grove afternoon will be the school break
filthy with the buck’s filthy scratches
transplanted into the hole in the popcorn umbrella

cramp the child’s name everybody knows
cramp is the child’s name except
except the crowd the cramp
except it’s the name
except
the son of the buck

all the tits
of the woman i am all the
manias of arms of fingers
all pallette on the map i bring along
all my mothers sisters
all the whites all the yolks
all the eggs that didn’t avenge all
the moments some other moments that didn’t
no key a window scratch all the
curtains a few waves almost all the
shells given up all the armpit hair
some rivers some bees all the leaves leagues
everything extra everything reaped on the way
in the deviation in the most particular deviations
some aggressions all the violence
rulers petticoats rules all red
all the pointers and any time
of the woman i am arms tits fingers
a few pages all the cutting errors all
the wrong books any canoe over trees
some badly cut nails no
latch no meat whichever suspicion

i’m talking about all the times a
man scratches himself
here is where i talk every time
about the woman who intends to catalog me woman
from here where i talk

there was only one chair for the couple
ovulated the wife sat on the chair
menstruated the wife sat
the man sat erect on the chair there was
only this convention between the couple
the chair was the regulating rite
of the dirtiness kind of object of contamination
of things woman in things man
then they lay down on the not only bed for one
pregnancy never happened and the wife died seated
in the chair the husband married again but
the new wife brought another chair with her and
pregnancy never happened first
the husband thought
we don’t use the same chair
the husband died in the first chair
and the second wife stayed with the house
with the only bed and got rid of the first
chair
a fisherman bought the chair for three
scrawny sardines and sat on the chair
before the world and exactly by the world was known
enveloped in the golden first
a chair where the first
and the contamination
the fisherman was begetting another chair
the third
a
daughter of that first convention

—translated by chris daniels
Carla Diacov is a Brazilian poet and artist born in São Bernardo do Campo in 1975. She makes paintings from menstrual blood and has written the books Amanhã Alguém Morre no Samba (Tomorrow Someone Dies in the Samba), A metáfora mais Gentil do Mundo Gentil (The Gentlest Metaphor in the Gentle World), Ninguém Vai Poder Dizer Que Eu Não Disse (No One Will Be Able to Say I Didn’t Say), bater bater no yuri and A Menstruação de Valter Hugo Mãe (The Menstruation of Valter Hugo Mãe).